domingo, 26 de setembro de 2010

A arma


Estendo os braços
Toco com as pontas de meu corpo-precipico
Esse lugar onde as ruas findam
As praças quebram
As noites evaporam
Os amores derretem
Você não tinha o direito de usar essa arma!

Os dias passam
Momentos degustados
Limpados em guardanapos
Nesse lugar onde as vontades calam
As pontes partem
As valsas escorregam
Você não tinha o direito de me apontar essa arma!

Com três momentos a queima-roupa
Com paredes cimentadas nas bocas
Era dezembro
Onde eu me perco
Bailo um tenso rodeio em despertar de outrora
Nesse lirismo-parto um desacordo nato!
Você não tem o direito de engatilhar a arma!

Passo-respiro-momento-e-fato
Faço um retrato nosso
Liso de desembaraço
Para estampar o café-da-manhã-burguesia
Mordo a carne de teus lábios
A pólvora desses nossos dias!
Na bamba janela canto
Triste valsa para dançar colado, ensangüentado no negro asfalto

David Cejkinski


quarta-feira, 8 de setembro de 2010

As ruas vazias
Teu corpo um naufrágio
Precipício, estes teus olhos-semáforos
Na esquina sonhar
Atravessando suas ruas
No parapeito do prédio
Emolduro o teu córrego
Na meia sarjeta
Cólera e engarrafamento
E as ruas vazias
Meu jeito parado
A pele pelada
Meus beiços melados
Você melodia
Teatro, um conto santo-retrato
As ruas vazias
Meus olhos gozosos
Virilha-poesia
Teus salmos jocosos
No meio dos pelos
Meu jeito manso nos teus
Olhos
Minha boca arredia
Faz anos lunáticos
Uma cor perturbada
Borrando minha pele
E as ruas vazias
Minha voz de bandeira
Dançando valsa-besteira
Um jeito rouco de andar
Lilás, azul, manifesto
O horizonte mais perto
Lento, deslizo em teu monumento

No vazio do meu corpo

David Cejkinski



terça-feira, 7 de setembro de 2010

(Du Bocage)


Por essa fresta de noite vejo ondas festeiras
Minhas asas estão cortadas
Não satisfeito procuro uma ronda
Atiro num corpo que não se entrega
Velejo um momento de fulga na veia
Cidade-vermelha
Varanda-ladeira
Descasco uma estrada
Como-orgia
Dos livros marotos
Bocage-diz
Que vai pintar
Brutais vagões de desejo
Sol de Lisboa nos dedos tecendo
Os nossos passos varados momentos
De rompimento, vou a outro país
No telefone sussurre comigo no ouvido
Aquele amor-meretriz

David Cejkinski