quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

(imagem de Vik Muniz)

Ela me dizia coisas sobre Fellini
Em Roma
Satyros com ternura e fitas carnavalescas no pescoço
Que deslizavam na acrópole
Oferecendo olhos-de-filme para os passantes
Que pulavam naquela vontade de monopolizar
A alegria
Ela dizia com um charme dos anos 30
Que não sambava na Bahia
Jogava confetes na sala de cinema para eternizar seu carnaval
Eram bocas de rouge-batom, espelho virado na tela, um cigarro a meio tom.
Na cama
Depois daquela velha cena sacana
Espalhava suas cinzas
No banheiro, cortina, para-peito, janela.
Dentro do peito escola de samba de verdade
Foliões na barriga, sombra nos olhos e aquele gozo nos pés.
Que mentiam para as câmeras
Vendendo harmonia
Na tela de cinema vazia
Seus olhos-redondos-verdes-filmes-enganos
Cantarolando marchinhas putanescas
Para seu amante
Em desalinho
Colombina bonita em sagrado vestido
Era descolorido
Em preto e branco
Seu mágico pranto, em close apelativo.
Para conquistar a grande Academia
Festival-melancolia
Aplaudindo aquela velha liturgia
Das serpentinas nos becos
Da maquiagem borrada
Da purpurina perdida
Carrosel-melodia
Das quartas-feiras quebradas
No calendário
Repleto de cinzas

David Cejkinski

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Já algum tempo sou aquela represa cheia na beira da boca
Que quando te olha nos olhos vaza
Sem navegar em nenhum oceano
Por isso iluminar sua pele
Por isso tuas vértebras desejantes
Desejo é fuga
Engano

Melhor outras maratonas
Outras chegadas, pódios, menos esperas.
Outras platéias
Pausas, silêncios, dor.
Outras mentiras
Musicas, milhas.
Paises

Preciso sair de repente falando outra língua
Te encontrar na esquina, combinar fracassos.
Entregar um bilhete-rubro-urbano
Falhado pela tinta suada
De nossas mãos
Parasitadas, mentes fartas.
Asfalto

Quero exterminar seus túneis místicos
Suas rezas matas
Seus altares
Sempre a me entregar na cama aflita
Já sou desespero
Inundação
Horizonte

Se sou transitório
Em outra parada perda
Outra estação de encanto
Era dentro do teu porto-estranho
Que fui lhe desejar o corpo
Mentiras em um livro escroto
Dizendo tudo
Nós

David Cejkinski